O Mercosul já avisou a União Europeia (UE) que o acordo birregional de livre comércio precisará ter diferentes velocidades de liberalização por causa de seu sócio mais recente, a Venezuela, conforme o Valor apurou. Formalmente, o Mercosul mencionou há algum tempo aos europeus somente a situação da Venezuela, que ainda está aderindo à Tarifa Externa Comum (TEC) e necessitará mais prazo para abrir seu mercado no âmbito de um futuro acordo entre os dois blocos.
No entanto, prospera o sentimento entre importantes negociadores sobre a importância da fórmula pela qual os membros do Mercosul aderem a um conjunto comum de regras na negociação com a União Europeia, mas adotam compromissos de liberalização mais rápidos ou mais lentos, algo possível inclusive pela falta de harmonização da TEC. Essa flexibilidade é considerada inevitável por esses negociadores, até por causa da persistente resistência da Argentina a compromissos de abrir seu mercado.
Por isso, o Brasil vem sinalizando no Mercosul que está disposto, se o vizinho portenho "precisar", a considerar formalmente a velocidade diferenciada no acordo com os europeus. A ideia é dar conforto para os argentinos protegerem por mais tempo seus setores sensíveis e, ao mesmo tempo, não impedir o acordo e prejudicar os sócios do bloco. O que interessa mais aos europeus é o mercado brasileiro, mas a UE não quer ser vista como enfraquecedora do Mercosul. Assim, é o bloco do cone sul que precisará formalizar a proposta de velocidade variada.
"A importância dessa fórmula é a chave para as negociações UE-Mercosul serem retomadas de maneira séria", diz o professor Alfredo Valladão, do Instituto de Estudos Políticos (Sciences Po) de Paris e presidente do conselho consultivo da UE-Brasil, entidade que há tempos propôs alternativas para a negociação sair do impasse. "Agora a questão é se a Argentina aceita essa fórmula ser aplicada no acordo com os europeus".
Na verdade, tanto a UE como o próprio Mercosul já têm acordos com aplicação variada de liberalização de seus mercados. Pelos entendimentos que o Mercosul tem com parceiros na América Latina, como Colômbia e Peru, cada membro do bloco assumiu calendário diferenciado de redução de tarifa de importação. Igualmente no acordo entre Mercosul e Índia, na fase final o Paraguai reclamou que não tinha obtido nada. Os indianos abriram uma cota tarifária (importação de determinada quantidade com tarifa menor) para soja paraguaia.
Para a negociação com a UE, o Mercosul precisa completar sua oferta de abertura do mercado. O Uruguai já teria sua proposta, o Brasil espera aprovar a sua no dia 28 na Câmara de Comércio Exterior (Camex) e a Argentina avisou que entrega sua oferta em setembro. Depois o Mercosul se reunirá para harmonizar uma proposta, provavelmente após as eleições na Argentina no fim de outubro.
Para se dar uma ideia do interesse por acordo comercial no Mercosul, basta ver uma tentativa mais modesta, com o Canadá. Foi aberto um "diálogo exploratório" que produziu um roteiro possível para negociação. Cada país ficou de analisar seu interesse. Até agora, apenas Brasil e Uruguai declararam que estão prontos a negociar. Por conta do pouco entusiasmo argentina, agora o próprio Canadá parece estar em dúvidas.
Por outro lado, o Paraguai, suspenso do Mercosul, procura no momento acelerar negociação com a Aliança do Pacífico (Colômbia, México, Peru, Chile e agora Costa Rica). Assim, quando voltar ao Mercosul poderá estar também em outro acordo na região.
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